por Diácono Georges Bonneval
“Na manhã do Pentecostes, ela presidiu na prece ao iniciar-se da evangelização, sob a ação do Espírito Santo: que seja ela a estrela da evangelização sempre renovada, que a Igreja, obediente ao mandato do Senhor, deve promover e realizar, sobretudo nestes tempos difíceis mas cheios de esperança!” (Papa Paulo VI, Evangelii Nuntiandi, n° 82)
Neste mês de agosto, celebramos com toda a Igreja, a Festa da Assunção da Virgem Maria. Em nosso Compêndio 2018, já apresentamos diversos traços importantes deste mistério mariano. A nossa fé católica faz-nos acreditar na presença de Maria no céu, em seu corpo e em sua alma, quer dizer, na integridade da sua pessoa. Pessoalmente associada ao mistério da Ressurreição e da Ascensão de Seu Filho, assim como ao da Sua Encarnação e da Sua Morte, ela goza, antes do gênero humano, da plenitude dos frutos da salvação: a redenção do seu próprio corpo.
Maria, Arca da Nova Aliança
Ela está unida tão intimamente ao Filho, a quem acolheu na fé e gerou na carne, que ela partilha plenamente com Ele, a glória do céu. A maternidade espiritual de Maria implica a graça de uma comunhão pessoal e total com o Verbo Encarnado, implica também a colaboração com Ele na Sua obra de salvação.
A verdadeira Arca da Aliança é uma pessoa viva e concreta: a Virgem Maria. Deus não habita num móvel, Deus reside numa pessoa, no coração humano. Maria é aquela que carregou no seu seio o Verbo Eterno de Deus feito homem e ela permanece a arca da presença de Deus, que Deus estabeleceu de maneira definitiva com toda a humanidade, em Cristo.
“Hoje, a Igreja canta o amor imenso de Deus por esta sua criatura: escolheu-a como verdadeira ‘arca da aliança’, como Aquela que continua a gerar e a oferecer Cristo Salvador à humanidade, como Aquela que no Céu compartilha a plenitude da glória e goza da mesma felicidade de Deus e, ao mesmo tempo, convida-nos a tornar-nos, também a nós do nosso modo modesto, ‘arca’ em que está presente a Palavra de Deus, que é transformada e vivificada pela sua presença, lugar da presença de Deus, a fim de que os homens possam encontrar nos outros homens a proximidade de Deus e, desta forma, viver em comunhão com Deus e conhecer a realidade do Céu.” (Papa Bento XVI, Homilia de 15 de agosto 2011, Igreja paroquial de S. Tomás da Villanova, Castel Gandolfo).
S. João Damasceno, referindo-se ao mistério da Assunção de Maria, afirma em uma das suas homilias:
“Hoje, a santa e única Virgem é conduzida para o templo celeste… Hoje, a arca sagrada e animada do Deus Vivo, (a arca) que trouxe no seu seio o próprio Artífice, descansa no templo do Senhor, não construído por mãos humanas… Era necessário que Aquela que tinha hospedado no seu ventre o Logos divino, se transferisse para os tabernáculos do seu Filho… Era preciso que a Esposa escolhida pelo Pai, habitasse no quarto nupcial do Céu.” (S. João Damasceno, Segunda homilia sobre a Dormição, pg. 96, 14, pg. 96, 742)
Aquela que é a Mãe do Verbo Encarnado e Redentor, é também do Cristo Ressuscitado e com Ele, ela deve estar na glória. Ela prefigura e antecipa, de uma certa maneira, aqueles – referidos por S. Paulo – que, sem morrer, passarão desta vida presente para a vida celeste. “Os vivos que estivermos lá, seremos arrebatados com eles nas nuvens para o encontro com o Senhor, nos ares. E assim, estaremos para sempre com o Senhor” (1Ts 4, 17).
Maria intercede no céu pela evangelização das nossas profundezas
A definição do Dogma da Assunção, implica a fé na intercessão excepcional de Maria. Porque se Maria está com Cristo na Sua glória, ela está igualmente com Ele quando este age nas almas e intercede por nós junto do Pai. Sua mediação celeste surge como a plena realização e o coroamento do seu papel terrestre. Profecia e premissa da nossa própria vocação celeste.
Contemplando a Virgem Maria, uma outra graça nos é dada: a de ver nossa vida em profundidade. Porque a nossa existência cotidiana, com seus problemas e expectativas, recebe uma luz e uma ajuda da Mãe de Deus, do seu próprio percurso espiritual, da sua vocação de glória.
A intercessão de Maria por nós, no céu, se compreende na teologia da intercessão e da comunhão dos santos. A intercessão de Maria não cessou desde o mistério da Encarnação e durará até ao fim do mundo. Ela acompanha e sustenta toda a oração. Além disso, poderíamos dizer que toda a oração está unida à sua oração. “Seria como querer voar nos céus sem asas o desejar rezar sem Maria”, declara Dante Alighieri (poeta italiano do século XIII).
Todas as graças “passam pelas mãos – ou pelo coração – de Maria”, ela é “a tesoureira dos dons de Deus”… Tudo o que lhe foi atribuído por pura graça, Maria nos obtém por sua maternal intercessão.
A palavra de Jesus na Cruz “eis tua mãe”, é dirigida a cada um de nós na nossa humanidade. Jesus é o homem em plenitude, designado até por um Pilatos, mesmo cego: “eis o homem” (Jo 19, 5). Assim, Maria sendo Mãe do Homem, não poderia ela ser mãe de cada um de nós, particularmente em tudo o que permanece ainda frágil, doente e imaturo? Jesus, na Cruz da Sua encarnação redentora, comunica Sua vida e Sua graça a toda a Igreja que é Seu Corpo. E a participação que Maria toma no sacrifício desta morte, a torna também Mãe dos homens.
No entanto, será em vão pensar que as orações dos santos, assim como as de Maria, poderiam “modificar” a vontade de Deus. Porque se as orações de Maria e dos santos corresponderam à graça do Espírito Santo, nós devemos rezar para lhe correspondermos também. Maria não pode contradizer seu Filho mas, ao contrário, tudo o que nos vem de Cristo, vem até nós pela sua oração. Podemos dizer, ao contrário, que a oração de Maria nos obtém o começo da vinda do Espírito. A oração é o ato da criatura, então ela é confiada àquela que foi a Imaculada e que reza por nós.
Se a Escritura declara, pelos escritos do Apóstolo Paulo, que Cristo é “um só mediador entre Deus e os homens” (1Tm 2, 5), toda outra mediação não pode ser senão dependente da sua e secundária. S. Tomás de Aquino (Cf. Summa, III, q. 26), faz a distinção entre a Mediação de Cristo (Cristo é o único mediador), mas essa mediação não impede as “mediações secundárias”, todas ao serviço da única mediação de Cristo.
A graça da Encarnação redentora implica uma cooperação de cada ser humano na sua própria salvação porque Deus, fazendo-se homem, não suplantou o homem, mas se associou a Ele. É por isso que, junto do Cristo Mediador, há lugar para todos aqueles que colaboram com Ele em vista da nossa salvação.
Entre as mediações secundárias que Deus utiliza para nossa cura e salvação, a de Maria é singular e vem em primeiro, porque é a extensão da sua maternidade divina. Invoquemos a Santa Virgem Maria, Estrela que guia nossos passos ao encontro de seu Filho, no caminho para a glória do céu, para a alegria eterna. Santo Ambrósio escreve:
“Esteja em cada um a alma de Maria para enaltecer o Senhor; esteja em cada um o espírito de Maria para exultar em Deus.”
Podemos pedir a Maria que acompanhe nossa oração. Sabemos que temos nela uma guia e um apoio, e é com toda a confiança que podemos lhe dizer: “Rogai por nós, pobres pecadores”.
“Esta ligação íntima entre Maria, a Igreja e cada fiel, enquanto de maneira diversa geram Cristo, foi maravilhosamente expressa pelo Beato Isaac da Estrela: ‘Nas Escrituras divinamente inspiradas, o que se atribui em geral à Igreja, Virgem e Mãe, aplica-se em especial à Virgem Maria (…). Além disso, cada alma fiel é igualmente, a seu modo, esposa do Verbo de Deus, mãe de Cristo, filha e irmã, virgem e mãe fecunda’.” (Papa Francisco, Evangelii Gaudium, n° 285)
Como a Virgem Maria participa da Nova Evangelização?
Segundo certos especialistas das aparições marianas ao longo da história, muitos concordam em dizer que, depois da metade do século XIX, os casos de aparições marianas parecem ter se multiplicado de maneira impressionante, em comparação com os séculos precedentes. Certos especialistas distinguem, geralmente, a visão da aparição, sendo esta última definida sobretudo como uma “revelação pública na sua manifestação e seus efeitos”. Nesses casos de aparição, “o” ou “os” videntes – geralmente crianças ou gente simples – são como mediadores entre a Virgem e a comunidade local à qual eles pertencem. Uma vez as aparições reconhecidas pela Igreja, esta pode se encarregar da organização do culto, até promover aí a ereção de um santuário.
Foi assim com Lourdes, Fátima, Guadalupe, La Salette… que se tornaram polos enormes de evangelização, de envergadura nacional e internacional, com o acolhimento de milhares de peregrinos ao longo do ano. Assim, Maria, através de suas aparições, participa em todos esses lugares de espiritualidade e de devoção, na Nova Evangelização na atualidade de cada geração. E isto, com um acolhimento particular de compaixão junto dos doentes e dos que sofrem.
Olha a Estrela, invoca Maria!
Oração de S. Bernardo (Homilia 2ª, “Sobre as glórias da Virgem Mãe”)
“O nome da virgem era Maria (Lc 1, 27). Esse nome, que dizem significar ‘estrela do mar’. Ela é efetivamente essa nobre estrela surgida de Jacob’, cujo esplendor ilumina o mundo inteiro. Ela brilha sobre a terra, ela aquece os corações, Ela faz amadurecer a virtude e consome o vício.
Vós todos, quem quer que sejais, seja o que for que sentirdes hoje, em pleno mar, sacudidos pela tormenta e pela tempestade, longe da terra firme, mantende os olhos na luz dessa estrela para evitar o naufrágio.
Se se levantarem os ventos da tentação, se vires aproximar-se o escolho das provações, olha para a estrela, invoca Maria! Se te sentires sacudido pelas vagas do orgulho, da ambição, da maledicência ou do ciúme, eleva os olhos para a estrela, invoca Maria.
Vossa alma foi sacudida como uma barca frágil Pela cólera, a avareza ou as seduções da carne? Olha para Maria!
Se te sentires perturbado pela enormidade dos teus pecados, humilhado pela vergonha da tua consciência, assustado pelo temor do julgamento, se estiveres a ponto de naufragar nas profundezas da tristeza e do desespero, pensa em Maria.
No perigo, pensa em Maria! Na angústia, na dúvida, invoca Maria! Que o seu nome nunca saia dos teus lábios nem do teu coração. Para obter o apoio da sua oração Nunca percas o exemplo da sua vida.
Seguindo-a, não te perderás; rezando-lhe, não desesperarás; pensando nela, evitarás enganar-te no caminho. Se Ela te agarrar pela mão, não te afundarás; se Ela te proteger, nada temerás; conduzido por Ela, ignorarás a fadiga; sob a sua proteção, chegarás ao objetivo.
E compreenderás, pela tua própria experiência, como são verdadeiras essas palavras: ‘O nome da virgem era Maria’ (Lc 1, 27).”