por Diácono Georges Bonneval

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Vimos no mês passado: Cristo é o centro visível da Igreja e da missão e, nesse sentido, podemos dizer que o Espírito Santo é o centro invisível, a alma da Igreja e da missão (cf. Cardeal Charles Journet, Teologia da Igreja, Ed. DDB, 1987).

A graça de Pentecostes – missão visível do Espírito Santo – tornou os apóstolos e os discípulos “cristoconformes”, segundo a promessa anunciada por Jesus: “Ele me glorificará porque receberá do que é meu e vos anunciará” (Jo 16, 14). É o Espírito Santo “que falou pelos profetas” (Credo, Símbolo de Niceia- Constantinopla). Quando, no dia de Pentecostes, o Espírito Santo encheu os discípulos do Senhor, não foi o começo de um dom, mas “um acréscimo da liberalidade”: de fato, os patriarcas, os profetas, os padres, os santos que viveram nos tempos antigos, foram alimentados do mesmo Espírito santificante, “embora não idêntica a medida dos dons” (S. Leão Magno, Sermão 76).

Sto. Agostinho escreveu que o dom e o envio do Espírito Santo, que se seguiriam à glorificação de Jesus, teriam tal significado que nunca havia acontecido coisa igual, não porque o Espírito Santo não havia sido enviado antes, mas porque nunca o fora dessa maneira (Cf. De Trinitate, Livro IV, capítulo 20).

Depois da Encarnação do Senhor, o Filho e o Espírito não cessam de visitar invisivelmente a Igreja. O Espírito Santo consagrou a Igreja no dia de Pentecostes, a conserva na unidade, organiza os carismas, a governa, guia suas missões e toma em mãos os seus destinos…

Sobre este tema, os Padres da Igreja comentaram bastante: “Onde está a Igreja, aí está o Espírito de Deus, e onde está o Espírito de Deus ali está a Igreja e toda a graça. E o Espírito é Verdade.” (Sto. Ireneu, Adversus haereses, III, 24). E ainda: “Se o Espírito Santo não estivesse presente, a Igreja não existiria. Mas se a Igreja existe, não há dúvida de que o Espírito Santo não falta” (S. João Crisóstomo, De Sancta Pentecoste, homilia I, 41).

A missão começa e recomeça sempre no Cenáculo

Logo depois da partida do Senhor, na Sua Ascensão, o primeiro “gesto”, a primeira “missão” da Igreja apostólica é de viver nove dias de retiro espiritual. Este princípio da “mãe das Novenas”, deveria inspirar e preparar as escolhas cruciais que precisamos viver durante a nossa vida, pelo menos as quatro ou cinco mais importantes durante o nosso destino terrestre.

“Todos estes, unânimes, perseveravam na oração com algumas mulheres, entre as quais Maria, a mãe de Jesus, e com os irmãos Dele. Naqueles dias, Pedro levantou-se no meio dos irmãos – o número das pessoas reunidas era de mais ou menos cento e vinte – e disse: ‘Irmãos, era preciso que se cumprisse a Escritura em que, por boca de Davi, o Espírito Santo havia de antemão falado…’” (At 1, 14-16)

Antes de começar a sua primeira missão, a Igreja se ajoelhou no Cenáculo com a Virgem Maria, aquela que sustentou e acompanhou a sua oração. Com Pedro, o primeiro Pastor, ela se coloca na escola das Sagradas Escrituras e as relê à luz da humanidade e dos sinais de Cristo (Cf. At 2, 14-41).

No dia de Pentecostes, esta comunidade orante e à escuta, no seu retiro espiritual, eis que é visitada, transportada e transbordante das virtudes infusas, dos dons e dos carismas do Espírito Santo! E é este mesmo Espírito que acompanhará, na sua história terrestre e até o fim dos tempos, esta frágil embarcação de Pedro. Quem reconhecerá que, através dos seus membros frágeis, é a eternidade que ela carrega em si? Quem compreenderá que a grande missão da Igreja que acaba de começar, não é um empreendimento humano, mas do Verbo Encarnado, que se prolonga e que só encontrará a sua completude na Parusia do seu Senhor?

Podemos acreditar que as sociedades humanas que visam um bem comum natural, são assistidas, de uma certa maneira, pela providência divina, sobretudo aquelas que, “nos esforços humanos à procura da verdade, o bem, e de Deus” (S. João Paulo II, Redemptoris Missio, n° 28). Mas, para a Igreja, trata-se de muito mais, porque ela é a Obra de Deus, fundada num ato supremo da oferenda de Amor de Cristo: “Todo poder foi me dado no céu e sobre a terra. Ide, portanto, e fazei que todas as nações se tornem discípulos, batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo e ensinando as a observar tudo quanto vos ordenei. E eis que eu estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos!” (Mt 28, 18-20).

Deus não lançou a barca da Igreja sobre as ondas do oceano do mundo, deixando-a só com sua livre inteligência e seus limites, dizendo: “Se virem sozinhos. Sigam em frente!”. A missão não procede de uma antecipação humana, mesmo se generosa, mas é pelo Espírito Santo que Deus assiste e conduz a Igreja, inspirando-a, sustentando-a, formando-a e vivificando-a. Ao contrário das iniciativas e esforços humanos, nunca pode haver missão, evangelização, catequese, sem a presença de Deus, que age através do Seu Espírito.

Em todas estas disciplinas, nem as técnicas pedagógicas mais avançadas, nem o pregador dotado da personalidade humana mais cativante, não podem substituir a ação silenciosa e discreta do Espírito Santo. É Ele, “o verdadeiro Protagonista de toda a missão eclesial” (Cf. S. João Paulo II, Redemptoris Missio, nº 21). Porque o Espírito Santo é, antes de tudo, Aquele que continua na Igreja e através dela, a missão salvífica de Jesus. Só podemos ser testemunhas de Cristo se nos deixarmos guiar pelo Espírito Santo, que é “o agente principal da evangelização”.

“Pode-se dizer que o Espírito Santo é o agente principal da evangelização: é Ele, efetivamente que impele para anunciar o Evangelho, como é Ele que no mais íntimo das consciências leva a aceitar a Palavra da salvação. Mas pode-se dizer igualmente que Ele é o termo da evangelização: de fato, somente Ele suscita a nova criação, a humanidade nova que a evangelização há de ter como objetivo, com a unidade na variedade que a mesma evangelização intenta promover na comunidade cristã. Através Dele, do Espírito Santo, o Evangelho penetra no coração do mundo, porque é Ele que faz discernir os sinais dos tempos, os sinais de Deus, que a evangelização descobre e valoriza no interior da história.” (Papa Paulo VI, Evangelii Nuntiandi, nº 75)

É, certamente, o Espírito Santo que age inspirando as palavras do pregador e do missionário que anunciam o Evangelho, mas Ele age também nos corações dos ouvintes que recebem essa mensagem; como veremos se realizar com Pedro pregando na casa de Cornélio, um oficial romano: “Pedro estava ainda falando estas coisas, quando o Espírito Santo desceu sobre todos os que ouviam a Palavra” (At 10, 44).

Notemos na passagem que, este Cornélio, mesmo se era pagão, não deixava de ser um homem “piedoso e temente a Deus, com toda a sua casa; dava muitas esmolas ao povo judeu e orava a Deus constantemente. Ele viu claramente, em visão, cerca da nona hora do dia, o Anjo do Senhor entrando em sua casa e chamando-o: ‘Cornélio!’ Fixando os olhos nele e cheio de temor, perguntou-lhe: ‘Que há, Senhor?’ E o Anjo lhe disse: ‘Tuas orações e t
uas esmolas subiram até a presença de Deus e Ele se lembrou de ti’”
(At 10, 2-4).

O Espírito Santo prepara a missão pelas “sementes do Verbo” (semina verbi) “

O Paráclito, o Espírito Santo que o Pai enviará em meu nome, vos ensinará tudo e vos recordará tudo o que vos disse.” (Jo 14, 26)

O Espírito Santo não vem somente iluminar, formar, instruir, aconselhar, segundo as palavras de Cristo no Evangelho. Mas, também, quantas vezes o missionário pode fazer esta constatação: a terra dos corações estava já preparada para receber, com fé e alegria, a Boa Nova. A graça de Deus foi semeada, por vezes, muitos anos antes e, no contato com a Palavra anunciada, eis que eclode e é fecundada. A memória humana se encontra, então, como que visitada e atualizada pela ação do Espírito Santo. O Espírito Santo já tinha, de alguma maneira “preparado, ao longe, a missão!”.

O Espírito do Senhor age em todo o universo, em todo ser, em todas as religiões e nas consciências, de maneira misteriosa. A teologia chama esta preparação da graça: “as sementes do Verbo”, que são como “preparações evangélicas”, as sementes, os raios, os reflexos da graça, depositados na vida das pessoas, e também na religião, na cultura, na arte, nos sinais dos tempos, etc. O Espírito, de fato, “sopra onde quer” (Jo 3, 8).

As sementes do Verbo: podemos verificar que esta expressão se encontra nos Padres da Igreja, em particular em S. Justino (na sua Apologia I, 46,1- 4; e Apologia II, 7, 10 e 13; em S. Clemente de Alexandria, em Stromata I, 19). Mas também em certas atas do Concílio Vaticano II, como Ad Gentes 11 e 15 e Lumen

Gentium 17. Encontramos também nos Escritos Apostólicos dos Papas (Paulo VI em Evangelii Nuntiandi, nº 53 e 80; S. João Paulo II em Redemptoris Homini, nº 11; Ecclesia in Africa, nº 67, etc).

“O mundo e a história estão cheios de sementes da Palavra. Não será, pois, uma ilusão o pretender levar o Evangelho aonde ele já se encontra, nestas sementes que o próprio Senhor aí lançou?” (Papa Paulo VI, Evangelii Nuntiandi, n° 80)

Estas preparações em gérmen, suscitadas pelo Espírito, são suscetíveis a conduzir as pessoas a se abrirem, um dia, à plenitude da Revelação em Jesus Cristo, através da proclamação da Palavra de vida. Mas, para isso, é necessário, da parte do missionário, um profundo respeito, uma atenção e uma escuta. O missionário não pode, hoje em dia, sair em missão de evangelização, ignorando este trabalho do Espírito que o antecede, como se estivesse já operando no coração das pessoas encontradas. É esta a “priori” do temor de Deus, de empatia e de discernimento, que deve preparar a sua missão. Porque o Espírito de Deus pode surpreender-nos muito, por vezes, e vir até mesmo a abalar os preconceitos e os julgamentos segundo as aparências. Enfim, podemos crer e esperar que o Espírito Santo está agindo no diálogo paciente. Este não deve ser considerado como uma estratégia ou um interesse para com a pessoa do evangelizador, mas como um serviço. Quantas pessoas experimentam a necessidade profunda de abrir seu coração, suas dores, suas preocupações profundas e não encontram a oportunidade nem pessoas disponíveis. Por vezes, este início de diálogo poderá se prolongar em um verdadeiro acolhimento espiritual, ou mesmo a um início de acompanhamento, até a volta aos sacramentos.

“O diálogo fundamenta-se sobre a esperança e a caridade, e produzirá frutos, no Espírito.” (S. João Paulo II, Redemptoris Missio, nº 56)

“Toda a vida de Jesus, a Sua forma de tratar os pobres, os Seus gestos, a Sua coerência, a Sua generosidade simples e cotidiana e, finalmente, a sua total dedicação, tudo é precioso e fala à nossa vida pessoal. Todas as vezes que alguém volta a descobri-Lo, convence-se de que é isso mesmo o que os outros precisam, embora não o saibam: “Aquele que venerais sem O conhecer, é Esse que eu vos anuncio” (At 17, 23). Às vezes perdemos o entusiasmo pela missão, porque esquecemos que o Evangelho dá resposta às necessidades mais profundas das pessoas, porque todos fomos criados para aquilo que o Evangelho nos propõe: a amizade com Jesus e o amor fraterno. Quando se consegue exprimir, de forma adequada e bela, o conteúdo essencial do Evangelho, da certeza que essa mensagem fala aos anseios mais profundos do coração: ‘O missionário está convencido de que existe já, nas pessoas e nos povos, pela ação do Espírito, uma ânsia – mesmo se inconsciente – de conhecer a verdade acerca de Deus, do homem, do caminho que conduz à liberação do pecado e da morte. O entusiasmo posto no anúncio de Cristo deriva da convicção de responder a tal ânsia’. O entusiasmo na evangelização funda-se nesta convicção. Temos à disposição um tesouro de vida e de amor que não pode enganar, a mensagem que não pode manipular nem desiludir. É uma resposta que desce ao mais fundo do ser humano e pode sustentá-lo e elevá-lo. É a verdade que não passa da moda, porque é capaz de penetrar onde nada mais pode chegar. A nossa tristeza infinita só se cura com um amor infinito.” (Papa Francisco, Evangelii Gaudium, n° 265)

Onde:

“A carência de espiritualidade profunda que se traduz no pessimismo, no fatalismo, na desconfiança. Algumas pessoas não se dedicam à missão, porque creem que nada pode mudar e assim, segundo elas, é inútil esforçar-se. Pensam: ‘Para que privar-me das minhas comodidades e prazeres, se não vejo algum resultado importante?’ Com esta mentalidade, torna-se impossível ser missionário. Esta atitude é precisamente uma desculpa maligna para continuar fechado na própria comodidade, na preguiça, na tristeza insatisfeita, no vazio egoísta. Trata-se de uma atitude autodestrutiva, porque ‘o homem não pode viver sem esperança: a sua vida, condenada à insignificância, tornar-se-ia insuportável’. No caso de pensarmos que as coisas não vão mudar, recordemos que Jesus Cristo triunfou sobre o pecado e a morte e possui todo o poder. Jesus Cristo vive verdadeiramente. Caso contrário, ‘se Cristo não ressuscitou, é vã a nossa pregação’ (1Cor 15, 14). Diz-nos o Evangelho que, quando os primeiros discípulos saíram a pregar, ‘o Senhor cooperava com eles, confirmando a Palavra’ (Mc 16, 20). E o mesmo acontece hoje. Somos convidados a descobri-Lo, a vivê-Lo. Cristo Ressuscitado e Glorioso é a fonte profunda da nossa esperança, e não nos faltará a Sua ajuda para cumprir a missão que nos confia.” (Papa Francisco, Evangelii Gaudium, n° 275)

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