por Diácono Georges Bonneval

 

 

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Deus não criou o homem para, em seguida, entregá-lo a si mesmo e à sua própria solidão, como se Ele o tivesse simplesmente lançado no turbilhão da vida. Desse modo, não teria cuidado nem benevolência para com a obra que Ele criou?

Mas Deus, pelo contrário, acompanha, guarda, ajuda, cuida da Sua criação… numa palavra “ama” aquilo que Ele mesmo criou.

Sim, tu amas tudo o que criaste, não te aborreces com nada do que fizeste; se alguma coisa tivesses odiado, não a terias feito. E como poderia subsistir alguma coisa, se não a tivesses querido? Como conservaria a existência, se não a tivesses chamado? Mas a todos poupas, porque são teus: Senhor, amigo da vida!” (Sb 11,24-26)

A Sagrada Escritura nos revela este amor único de Deus por cada uma das suas criaturas sem exceção, mesmo antes do nosso próprio nascimento e existência!

Pois Tu formaste os meus rins, Tu me teceste no seio materno. Eu Te celebro por tanto prodígio, e me maravilho com as Tuas maravilhas! Conhecias até o fundo do meu ser: meus ossos não te foram escondidos quando eu era modelado, em segredo, tecido na terra mais profunda. Teus olhos viam o meu embrião. No Teu livro estão todos inscritos os dias que foram fixados e cada um deles nele figura.” (Sl 139, 13-16)

Mas, mais ainda, o Pai remete entre as nossas mãos o Seu maior tesouro, o Seu maior amor: o Seu Filho único. E Jesus não vai se contentar em nos “falar” do amor do Seu Pai, Ele o cumpre com a Sua própria vida e em toda a Sua vida. Cada uma das Suas ações e das Suas palavras – até à cruz – nos revela um reflexo do rosto amoroso do Pai. Além disso, Jesus nos ama com o mesmo amor incomensurável que o Seu Pai: “Assim como o Pai me amou também eu vos amei.” (Jo 15,9).

Cada ser humano é beneficiário de uma eleição de amor gratuito da parte do Pai. O drama é que muitos não receberam essa evidência interior pela fé e outros continuam a ignorá-la ou são habitados por dúvidas profundas.

Nele nos escolheu antes da fundação do mundo para sermos santos e irrepreensíveis diante Dele no amor. Ele nos predestinou para sermos seus filhos adotivos por Jesus Cristo.” (Ef 1,4-5)

Acima de tudo, o Senhor deu-nos o DNA do Seu Filho, Ele nos fez filhos no Filho, à sua imagem e semelhança, como Ele. Ninguém pode retirar esse dom e essa dignidade que é atribuída a cada ser como um tesouro sem retorno.

Fitando-o, Jesus o amou.” (Mc 10,21)

Esta Boa Nova do Evangelho está escondida neste mundo como um tesouro inestimável, até que a fé o descubra. Aquele que, então, encontrou esta pérola de grande valor, vai vender tudo o que possui, e compra a pérola! (cf. Mt 13,45).

Esta pérola única é a verdade, e a verdade é una, ela é indivisível. Possuis esta pérola? Tu conheces o valor dela. Os descrentes, que ignoram a sua natureza e o seu valor, não têm nenhuma ideia da sua riqueza incomparável. “Se conhecesses o dom de Deus!” (Jo 4,10).

Mas devemos preferi-la com alegria e sem hesitar. Para se procurar esse tesouro, duas condições são necessárias: a renúncia aos bens deste mundo e uma firme determinação na nossa escolha.

É por isso que, antes de qualquer nova orientação e decisão nas nossas vidas, convém reconsiderar e voltar a esse dom e tesouro inestimável do amor de Deus, que é o fundamento essencial da nossa vida sobre a terra.

Nós somos todos chamados por Deus… porque amados!

Então, eu tenho que amar antes de mais nada… para conhecer… o projeto de Deus para a minha vida.

Compreendi que, se a Igreja tinha um corpo, composto de diversos membros, o mais necessário, o mais nobre de todos não lhe faltava. Compreendi que a Igreja tinha um coração e que esse coração ardia de amor.

Compreendi que só o Amor levava os membros da Igreja a agir, que se o Amor viesse a extinguir-se os apóstolos não anunciariam mais o Evangelho, os mártires negar-se-iam a derramar o sangue. Compreendi que o Amor abrangia todas as vocações, que o Amor era tudo, que abrangia todos os tempos e todos os lugares, numa palavra, que ele é Eterno!”. (Sta. Teresa do Menino Jesus, Manuscritos Autobiográficos B, 2 e 3)

A ação de graças: a nossa primeira resposta ao dom do amor de Deus!

O salmista pergunta-se: “Como retribuirei ao Senhor todo o bem que me fez? Erguerei o cálice da salvação, invocando o nome do Senhor” (Sl 116, 12-13).

Como uma criatura humana teria por si mesma os meios de retribuir a Deus todo o amor que Ele tem por ela? E S. Paulo pergunta: “Quem primeiro lhe fez o dom para receber em troca?” (Rm 11,35).

No século XVII, Sta. Margarida-Maria (1647-1690) resumiu toda a espiritualidade do Sagrado Coração de Jesus: “Aprender a amar Jesus, que me impelia tão fortemente a restituir-lhe amor por amor…”.

A oferenda do nosso agradecimento, da nossa ação de graças, do nosso louvor gratuito, é o primeiro passo na resposta do crente ao dom inestimável de Deus! É esse o sentido da palavra “eucharistein” que significa em grego “dar ação de graças”.

Sempre e em tudo, dai graças a Deus, o Pai, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo” (Ef 5,20). Então, o nosso apelo filial e quotidiano a dar graças ao Senhor, justifica, por si mesmo, a nossa necessidade de participar diariamente na celebração eucarística!

Segundo o Apóstolo Paulo, a ação de graças tem a ver com o fato de corresponder à vontade de Deus nas nossas vidas:

Alegrai-vos sempre, orai sem cessar. Por tudo dai graças, pois esta é a vontade de Deus a vosso respeito, em Cristo Jesus” (1 Ts 5,16-18).

A ação de graças para com Deus, pela nossa história, permite-nos abrir mão da nossa própria vida e da nossa pessoa. Uma tentação frequente entre os jovens de hoje, é a de procurar controlar tudo por si mesmo, nossos projetos, nossa segurança, nosso futuro, os acontecimentos imprevistos… para não cometer nenhum erro e evitar ter que sofrer.

A ação de graças é a primeira chave do dom de si que nos descentra de si mesmo. “Eu me entreguei… e Jesus fez todo o resto!” (Sta. Teresa de Couderc).

Por fim, a ação de graças, é reconhecer que tudo o que eu vivo, o que eu sou, o que eu tenho… eu o recebi da parte de Deus! “Que possuis que não tenhas recebido?” (1 Cor 4,7).

E, por outro lado, recusar dar graças, é escolher uma postura de “impiedade” (asebeia em grego, que é o contrário de eucaristia…), quer dizer o não reconhecimento e mesmo a recusa de agradecer! Não como os incrédulos que não acreditam, mas no fato de ignorar Deus e de “agir como se Ele não existisse…”. Trata-se, então, de um resvalar para uma espécie de ateísmo prático, de relativismo que atinge muitos jovens da nossa época:

Tendo conhecido a Deus, não o honraram como Deus nem lhe renderam graças; pelo
contrário, 
eles se perderam em vãos arrazoados, e seu coração insensato ficou nas trevas…”. (Rm 1,21)

Os jovens são particularmente sensíveis à falta de significado e de valores que muitas vezes os circunda e que gera uma vazio. E, infelizmente, sofrem as consequências. Ao contrário, o encontro com Jesus vivo, na Sua grande família que é a Igreja, enche o coração de alegria, porque o torna repleto da verdadeira vida, de um bem profundo, que não passa e que é imarcescível: vimo-lo nos rostos dos jovens no Rio. Mas esta experiência deve enfrentar a vaidade quotidiana, aquele veneno do vazio que se insinua nas nossas sociedades fundamentadas no lucro e na posse, que iludem os jovens com o consumismo. O Evangelho deste domingo recorda-nos precisamente o absurdo de basear a própria felicidade na posse. O rico diz a si mesmo: ‘Ó minha alma, tens muitos bens em depósito… descansa, come, bebe e regala-te!’ Deus, porém, diz-lhe: ‘Insensato! Ainda nesta noite exigirão de ti a tua alma. E as coisas que acumulaste, de quem serão?’ (cf. Lc 12, 19-20).

Caros irmãos e irmãs, a verdadeira riqueza é o amor de Deus compartilhado com os irmãos. Aquele Amor que vem de Deus e que nos leva a compartilhá-lo entre nós e a ajudar-nos uns aos outros. “Quem o experimenta não tem medo da morte e recebe a paz do coração.” (Papa Francisco, Ângelus, Domingo, 4 de agosto de 2014, praça de S. Pedro, Roma)

 

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